Bette Davis em cinco ótimos telefilmes


Entre os vários filmes para a TV que Bette Davis protagonizou no final da década de 1970 e início da de 1980, alguns, apesar de hoje esquecidos, merecem ser vistos

Que Bette Davis estrelou grandes clássicos do cinema como Escravos do Desejo (Of Human Bondage, 1934), Jezebel (Jezebel, 1938), A Carta (The Letter, 1940), A Malvada (All About Eve, 1950) e O Que Teria Acontecido a Baby Jane? (What Ever Happened to Baby Jane?, 1962), entre outros, não é novidade. Sua filmografia é extensa.

Por outro lado, uma grande parcela do público não costuma prestar atenção aos trabalhos que a atriz fez para a televisão, na fase final de sua carreira (embora, na época, ela não considerasse de forma alguma que era a “fase final”).

Quando quase não recebia mais convites para cinema, foi a televisão que abrigou o enorme talento da atriz, gigante demais para se aposentar antes da hora. “É a melhor vida do mundo. Claro, eu faria tudo de novo. Tive muita sorte. Nunca vou me aposentar. Eu trabalho para me manter viva. Amo o que faço. Além disso, o que mais eu faria?”, disse Bette, aos 71 anos, em uma entrevista para a revista Films lllustrated, em 1979.

Na década de 1970, sem conseguir papéis relevantes no cinema, a atriz continuou tocando sua carreira com dignidade e empenho, acolhida pela televisão. Mesmo que na época a tevê ainda fosse considerada um veículo “menor” e de menos prestígio, Bette desempenhava seus papéis nos telefilmes com a mesma paixão e profissionalismo que haviam se tornado suas marcas registradas no cinema.

Já na casa dos 70 anos, ela protagonizou vários filmes para a tevê, muitos deles elogiados. Podiam não ter a grandiosidade das produções que ela estrelara no cinema, entre os anos 1930 e 1950, mas certamente contavam com o mesmo brilho das inesquecíveis atuações de Davis. Considero cinco deles imperdíveis:

O Desaparecimento de Aimée (The Disappearance of Aimee)

Estreia na TV americana: 17 de novembro de 1976 (NBC)

Estreia na TV brasileira: 21 de novembro de 1979 (Globo)

Direção: Anthony Harvey

Elenco: Faye Dunaway, Bette Davis, James Woods

A história verídica do misterioso desaparecimento da pregadora protestante Aimée Semple McPherson (Faye Dunaway), em 1926, durante cinco semanas. Ao reaparecer, alega que havia sido sequestrada e divide opiniões. Bette Davis interpreta Minnie, a mãe que não acredita na história. O suspense é mantido e a narrativa é instigante. Elenco de primeira e produção caprichada. Muitas histórias de bastidores, especialmente a que se tornou mais notória: Bette odiou Faye Dunaway logo de cara, devido ao desinteresse que Faye demonstrava pelo filme, seu ar blasé e seus atrasos para as gravações — um comportamento inadmissível para uma profissional como Bette. (Ironicamente, alguns anos depois Dunaway interpretou a maior rival de Bette, Joan Crawford, no filme Mamãezinha Querida). Lançado no Brasil também em vídeo. 

Difícil Reencontro (Strangers: The Story of a Mother and Daughter)

Estreia na TV americana: 13 de maio de 1979

Estreia na TV brasileira: 19 de dezembro de 1981 (Globo)

Direção: Milton Katselas

Elenco: Bette Davis, Gena Rowlands, Ford Rainey

Abigail (Gena Rowlands), que deixou a casa dos pais após um rompante de desentendimento, retorna 20 anos depois para tentar reconstruir o relacionamento com Lucy (Bette Davis), a mãe ressentida e solitária. Com dificuldade, Abigail vai quebrando o gelo aos poucos, até que as coisas começam a se encaminhar para um entendimento entre as duas mulheres. Mas Lucy descobre que a filha está com uma doença terminal e a acusa de egoísta e interesseira. Novamente um embate se inicia entre mãe e filha. Davis e Rowlands estão impecáveis em papéis fortes e tocantes, que não caem na pieguice costumeira dos telefilmes. Bette ganhou um merecido prêmio Emmy por sua atuação. Na minha opinião, o melhor telefilme da carreira de Davis.

Mamãe Branca / Com Afeto Contra a Violência (White Mama)

Estreia na TV americana: 5 de março de 1980 (CBS)

Estreia na TV brasileira: 1.º de março de 1982 (Globo)

Direção: Jackie Cooper

Elenco: Bette Davis, Ernest Harden Jr., Eileen Heckart

Davis interpreta Adele, uma viúva idosa, pobre e solitária, que vive em um prédio de apartamentos, num bairro pobre de negros. Orgulhosa demais para simplesmente aceitar o auxílio do governo, a velha insiste em continuar vivendo naquele gueto. No entanto, se ela adotar uma criança, passa a receber uma ajuda de custo para ser mãe de criação. Dessa forma, assume os cuidados do adolescente negro B.T. (Ernest Harden Jr.). Logo de cara, a relação dos dois se mostra complicada. Adele pretende ensinar ao jovem, acostumado à dureza das ruas,  valores como afeto, respeito e confiança. Em contrapartida, o rapaz vai se tornando uma companhia para Adele e, com o tempo, passa a enxergar nela a mãe que nunca teve. Mas antes disso, os dois passarão por alguns percalços. White Mama rendeu outra indicação ao Emmy para Bette Davis.

No Compasso da Esperança (A Piano for Mrs. Cimino, 1982)

Estreia na TV americana: 3 de fevereiro de 1982 (CBS)

Estreia na TV brasileira: 28 de abril de 1984 (Globo)

Direção: George Schaefer

Elenco: Bette Davis, Penny Fuller, Christopher Guest

Singelo e comovente drama baseado no livro homônimo de Robert Oliphant. Esther Cimino (Bette Davis) é uma viúva de 73 anos, considerada incapaz, pelo filho, de cuidar de si mesma e de seus bens. Apesar de seus protestos, Esther é considerada incapaz pela justiça também, o que fará com que ela lute para recuperar novamente sua autonomia e sua dignidade. Enquanto isso, seus bens são colocados nas mãos de um administrador e Esther é internada. Atordoada, descobre que todas as suas posses foram vendidas, incluindo seu amado piano. Aos poucos vai restaurando sua saúde e inicia uma jornada em busca de sentido para a própria existência. Ela quer agora recuperar o controle de sua vida. Cheio de momentos tocantes e bem-humorados, o filme e a atuação de Davis são deliciosos.

Direito de Morrer (Right of Way, 1983)

Estreia na TV americana: 21 de novembro de 1983 (HBO)

Estreia na TV brasileira: —

Direção: George Schaefer

Elenco: Bette Davis, James Stewart, Melinda Dillon

Filmado em 1982 pelo mesmo diretor de No Compasso da Esperança, aqui Bette Davis e James Stewart — duas lendas da era de ouro do cinema — se reúnem pela primeira vez em um filme. Mini (Davis) e Teddy (Stewart), um casal idoso, decide pôr fim à vida quando Mini contrai uma doença fatal. Mas a filha deles, com a ajuda do serviço de assistência social, tenta mudar a decisão. Baseado na peça de Richard Lees, de 1978, o filme gerou certa polêmica pelo tema delicado. O suicídio é uma alternativa válida para um casal de idosos que não quer se separar e nem testemunhar a própria degradação física causada pela velhice e pela doença? Apesar das atuações irrepreensíveis de Davis e Stewart e do tema controverso, não deixa de ser uma história deprimente. Três finais diferentes foram filmados. Lançado no Brasil também em vídeo.


QUEM SOU EU

Daniel Couri, formado em Jornalismo pelo Centro Universitário de Brasília, fã de cultura pop e autor dos livros Made in Suécia – O Paraíso Pop do ABBA (Página Nova, 2008) e Mamma Mia! (Panda Books, 2011). 

danielcouri@obscuradoria.com.br