Quando autismo ainda era um tabu e mal se falava no tema, uma produção para a TV abordou o assunto e marcou época
Um dos telefilmes mais marcantes e elogiados (embora, hoje, esquecido) da década de 1970 foi O Amor é Mais Forte (A Circle of Children, 1977). O título tipicamente piegas não podia deixar de seguir a tradição dos nomes em português. Dirigido por Don Taylor, com roteiro assinado por Steven Gethers e Mary MacCracken (também autora do livro homônimo), o filme mostrava o difícil começo e a subsequente adaptação de uma professora a uma turma de crianças com necessidades especiais.

Jane Alexander é Mary MacCracken, a professora em questão. Lidando com uma separação recente, ela não se contenta em virar apenas mais uma divorciada de classe média alta. Quer dar um novo rumo à sua vida, fazer algo que a desafie e a gratifique. Decide voluntariar-se para o trabalho com crianças autistas.



Mary assume a árdua missão de estagiar para substituir a experiente Helga (ótima interpretação de Rachel Roberts), professora mais velha, que está prestes a mudar de escola. Mas Helga não se convence facilmente da capacidade de Mary. Mesmo com a inicial descrença e certo ressentimento de Helga, Mary consegue, ao longo do filme, provar sua competência, paciência e determinação no trato com as crianças.



Seus esforços são recompensados quando ela se aproxima de Brian (Matthew Laborteaux), um garoto autista de 8 anos, e consegue, aos poucos, se comunicar com ele e ensiná-lo a se comunicar com os outros. Laborteaux era uma criança bem conhecida na tevê americana, nos anos 1970. Aqui no Brasil, é mais lembrado por seu papel em A Maldição de Samantha (Deadly Friend, 1986), que protagonizou depois de crescido.


O livro autobiográfico A Circle of Children, publicado nos EUA em 1974, é sobre a experiência da “verdadeira” Mary ao lidar com crianças tão perturbadas emocionalmente a ponto de não conseguirem inserir-se na sociedade. É a história de uma mulher cujo envolvimento com essas crianças mudou não apenas a vida das crianças em questão, mas também sua própria vida.


Curiosidades: a garotinha de Halloween (1978), Kyle Richards, interpreta uma das alunas da professora Mary. Kyle era figurinha fácil da TV americana nas décadas de 1970 e 1980.

Outra atriz mirim que interpreta uma das alunas de Mary é a garotinha Michelle Stacy, da impagável cena de Apertem os Cintos… O Piloto Sumiu (Airplane!, 1980), em que o garoto pergunta se ela aceita um café. Ela aceita e então ele pergunta se ela vai querer com creme. Ao que ela responde: “Não, obrigada. Eu tomo puro. Feito meus homens.” (Em inglês: No, thank you. I take it black, like my men.)


O Amor é Mais Forte estreou na TV americana em 10 de março de 1977, na CBS. Aqui no Brasil, foi exibido pela primeira vez em 3 de junho de 1978, na Globo.


Foi indicado ao Emmy de 1977 e teve uma continuação igualmente elogiada: Lovey: A Circle of Children, Part II (1978), dirigido por Jud Taylor. Na tevê brasileira, foi exibido com o nome de Crianças Bem Amadas (estreou na Globo em 27 de novembro de 1980). Na sequência, Mary, mais segura e experiente, assume uma nova turma.

Dessa vez o foco foi Hanna (Kristine McKeon), uma agressiva garota autista, de aspecto selvagem, dada a ataques violentos de raiva. Novamente, Mary precisou usar toda sua sensibilidade para chegar até Hanna, compreendê-la e socializá-la.



Filmes como esses — simples, porém marcantes — geralmente acabam esquecidos nas camadas mais distantes e desbotadas da nossa memória afetiva. De vez em quando é bom desenterrá-los.