Como filmes tão despretensiosos (e hoje esquecidos) revelaram uma artista tão talentosa e competente como Jodie Foster
Jodie Foster dispensa apresentações detalhadas. Seu talento é conhecido nos quatro cantos do mundo. Consagrada atriz, diretora e produtora de cinema, premiada com o Oscar duas vezes, sem falar nos Globos de Ouro e outros tantos troféus e inúmeras indicações.

Jodie começou sua carreira profissional como modelo infantil, quando tinha apenas três anos, no comercial de TV do protetor solar Coppertone. A estreia como atriz mirim foi em 1968, no seriado Mayberry R.F.D, do canal CBS. No final dos anos 1960 e início dos 1970, participou de várias séries de televisão e fez sua estreia no cinema com Napoleão e Samantha (Napoleon and Samantha, 1972), da Disney.
Formada em Literatura pela Universidade de Yale — uma das instituições de ensino superior mais conceituadas e antigas dos Estados Unidos — Jodie (cujo nome real é Alicia Christian Foster) começou sua vida artística estrelando comerciais de televisão para a Coppertone, aos três anos de idade. Ao longo da infância, fez diversos papéis em séries de tevê e filmes infantis.

Mas o grande reconhecimento veio aos 13 anos, na pele de uma prostituta adolescente no filme Taxi Driver – Motorista de Táxi (1976), de Martin Scorsese, no qual contracenou com Robert De Niro. A jovem atriz alcançou fama mundial com o sucesso do filme e, de quebra, sua primeira indicação ao Oscar (como Melhor Atriz Coadjuvante). Talvez por isso, vários papéis subsequentes tentaram explorar seu lado sensual.

O que nem todos sabem é que a partir daquele período, Jodie participou de uma série de modestas e pouco conhecidas produções europeias, intercaladas com bem-sucedidos filmes para os estúdios Disney. A jovem não tinha frescura, embarcava em tudo. Ao longo de 1976 e 1977, ela estrelou nada menos do que oito (!) filmes. Começou com o drama Ecos de Um Verão (Echoes of a Summer, 1976), seguido pelo cultuado Taxi Driver (1976), pelo musical Quando as Metralhadoras Cospem (Bugsy Malone, 1976), pela divertida comédia juvenil da Disney Se Eu Fosse a Minha Mãe / Um Dia Muito Louco (Freaky Friday, 1976) e pelo drama de suspense A Menina do Outro Lado da Rua (The Little Girl Who Lives Down the Lane, 1976). No ano seguinte, emendou as chanchadas Quero Ser Mulher (Moi, Fleur Bleue / Stop Calling Me Baby!, 1977) e Casotto / Beach House (1977) e o filme da Disney Candleshoe – O Segredo da Mansão (Candleshoe, 1977).



É admirável notar como Jodie, ainda adolescente, fazia trabalhos tão distintos quase ao mesmo tempo. Passava do drama pesado à comédia musical, das modestas chanchadas europeias à aventura dos estúdios Disney, sem cerimônia. Bebia de todas as fontes. Enquanto alguns desses filmes tornaram-se bem conhecidos, outros permanecem obscuros. Quero Ser Mulher é um deles. Nessa comédia francesa (que pouco tem de engraçada), Foster é uma ninfeta de 15 anos que quer perder a virgindade e sai em busca de um homem “de verdade” para realizar seu desejo. Sua irmã mais velha é uma espevitada e sexy modelo, que começa um caso com um atrapalhado motorista de caminhão obcecado por ela. Jodie, que na época já era uma jovem estrela em ascensão, estava morando na França (onde passou nove meses aprimorando o francês).



Situações ora ingênuas, ora embaraçosas e diálogos não muito inspirados recheiam esse filme que, certamente, não deve estar entre os orgulhos de Jodie. Filmado em francês e inglês, o longa teve várias canções de sua trilha sonora gravadas pela própria atriz, como Je T’Attends Depuis La Nuit Des Temps, La Vie C’est Chouette e When I Looked at Your Face, esta última a versão em inglês da primeira e muito tocada no filme. Chegou a ser lançada em compacto na Europa e até fez sucesso por lá. Aqui no Brasil a faixa foi parar na trilha sonora internacional da novela Te Contei? (1978), como tema dos personagens Helena (Ilka Soares) e Wagner (Reynaldo Gonzaga), da trama de Cassiano Gabus Mendes. Na época, Jodie chegou a se apresentar em vários programas musicais da TV francesa.
Abaixo, diferentes versões, lançadas na Europa, do compacto When I Looked At Your Face:







Com tantos filmes em tão pouco tempo, no final de 1977, após a estreia de Candlehoe – O Segredo da Mansão, Foster deu um tempo. Reapareceu em 1980 (ano em que completou 18 anos), estrelando o filme Gatinhas (Foxes), longa de estreia do diretor Adrian Lyne (de Flashdance, 9 1/2 Semanas de Amor, Atração Fatal, Proposta Indecente etc.). A performance de Jodie ganhou elogios nesse filme cujo foco é a vida de um grupo de adolescentes de San Fernando Valley, nos arredores de Los Angeles, no final da década de 1970.



Também em 1980 Foster participou de O Circo da Morte (Carny), no papel de uma jovem garçonete que foge de casa com uma trupe de artistas mambembes desiludidos. O título em português não ajuda muito, pois dá a ideia de se tratar de um filme de terror quando, na verdade, trata-se de um drama. Assim como Gatinhas, O Circo da Morte também é pouco conhecido na filmografia de Jodie Foster, mas um interessante registro da passagem da atriz dos papéis adolescentes para outros mais adultos, que viriam ao longo daquela década.

Ao contrário de atrizes mirins que tiveram grande popularidade e sucesso na infância, mas não conseguiram manter suas carreiras após a transição para a vida adulta (Shirley Temple, Tatum O’Neal e Kristy McNichol são alguns exemplos), Jodie cresceu e foi aumentando seu êxito no cinema. Jamais se deslumbrou com o sucesso e sempre prezou a cultura e a educação formal, em vez de só correr atrás de fama. Como atriz adulta, o primeiro grande momento veio em 1988, ao ganhar o Oscar de Melhor Atriz pelo filme Acusados (The Accused), de Jonathan Kaplan. Em 1991, conquistou seu segundo Oscar com O Silêncio dos Inocentes (The Silence of the Lambs), de Jonathan Demme.

Hoje, quando assistimos aos trabalhos da fase adolescente de Jodie, é até difícil imaginar que filmes tão despretensiosos pudessem revelar uma artista tão talentosa e competente. Gosto particularmente de Se Eu Fosse a Minha Mãe, Quando As Metralhadoras Cospem e A Menina do Outro Lado da Rua. Todos do mesmo ano e completamente diferentes um do outro. Mas todos com uma coisa em comum: a inquestionável versatilidade de Jodie Foster.
