Como anunciado no rádio e na TV


Para a geração de adolescentes da década de 1970, em especial, o legado do empresário Philip Kives foi uma longa lista de coletâneas de hits, em LPs de capas atraentes, contendo até 20 faixas

No final dos anos 1960, o empresário canadense Philip Kives fundou a K-Tel, companhia que ficou famosa por suas coletâneas de discos “As-Seen-On-TV” (aqui no Brasil, “Como anunciado no Rádio e na TV”). Sempre cheio de ideias, Kives (daí o ‘K’ de K-Tel) já tinha trabalhado como vendedor de porta em porta e também em loja de departamentos.

Philip Kives

No começo da década de 1960, usou sabiamente a propaganda de televisão para vender frigideiras de Teflon (na época, ainda novidade) e uma série de diversos utensílios domésticos. Escova removedora de pelos em tecidos, cortador multiuso de legumes, faca que cortava qualquer coisa e outros apetrechos inovadores na época. Dessa forma, por meio de comerciais na TV, conseguia atingir um grande público de uma só vez.

Mas o nome K-Tel ganhou o mundo quando Kives começou a lançar LPs com um punhado de hits que vendiam como água. Em 1965, ele lançou a primeira coletânea, um apanhado de 25 canções country, batizada de 25 Great Country Artists Singing Their Original Hits. Apesar de criativo, Kives nunca planejou essa incursão ao mercado fonográfico. Na época, foi apenas mais uma de suas muitas ideias. “Pensei: ‘por que não montar um disco’? Achei que seria algo inovador”, disse ele, em 2005. “As pessoas me disseram ‘isso não vai funcionar’. Hoje em dia todos os grandes selos lançam coletâneas, mas o meu foi o primeiro.”

A K-Tel foi formalmente fundada em 1968, com Kives como diretor executivo da empresa. Com enorme sucesso e popularidade na década de 1970, a companhia se expandiu rapidamente, espalhando subsidiárias pelo mundo. A grande sacada era montar coletâneas de artistas variados da época, que estavam nas paradas de sucesso do momento. Os LPs da K-Tel tinham, geralmente, 20 faixas — o que era uma grande novidade, já que os LPs tradicionais comportavam, no máximo, 14 faixas.

Philip Kives e seu império de coletâneas

O segredo era editar cada faixa. Ou seja: reduzir as canções, de maneira que tivessem a duração diminuída. Dessa forma, cabia um número maior de faixas no disco. O slogan das coletâneas da K-Tel era: “20 Original Hits! 20 Original Stars!”. Alguns discos vinham até com 24 faixas. Um verdadeiro luxo naqueles distantes anos 1970.

Outra particularidade das coletâneas da K-Tel era o título: os discos eram sempre temáticos e a arte gráfica era feita de acordo com o tema de cada álbum.

Sempre montadas seguindo as músicas que estavam no topo da hit parade, essas coletâneas formavam uma salada musical do que fazia sucesso na época. Canções dançantes, baladas românticas e rock dividiam o mesmo LP, para alegria geral dos consumidores de música pop.

Em outras palavras, as coletâneas da K-Tel eram a melhor maneira para o público ter todos os sucessos pop das paradas em um só álbum, de forma barata e sem precisar gastar um monte de dinheiro em diversos compactos separados.

Alguns discos, no entanto, eram dedicados a gêneros específicos, como por exemplo rock, discothèque, flashback ou música italiana. A mais famosa dessa série temática foi Hooked on Classics, até hoje muito conhecida. Lançado em 1981, o álbum era um grande pot-pourri que reunia trechos de obras conhecidas da música clássica, como diz o próprio nome. As faixas ganharam uma batida mais acentuada, com arranjos modernos, que pendiam para o rock ou para a disco music.

A ideia foi de Louis Clark, arranjador musical da Electric Light Orchestra e também maestro da Royal Philharmonic Orchestra. Hooked on Classics fez tanto sucesso que deu origem a outros volumes. Os seguintes, no entanto, não chegaram a fazer o mesmo sucesso do primeiro. Mas a coleção teve um efeito positivo: aproximou e reavivou o interesse da nova geração por música clássica. Vendeu mais de 10 milhões de cópias.

No começo da década de 1980, a K-Tel já havia vendido meio bilhão de discos ao redor do mundo. Entretanto, por volta de 1984, empreendimentos de alto risco já haviam minado a estabilidade econômica da K-Tel e a empresa perdeu espaço no mercado.

Kives em 2009

Em 2016, Philip Kives faleceu, aos 87 anos. Pioneiro do infomercial (informação + comercial) — aqueles anúncios longos, parecidos com um programa de TV, mas feitos para vender um produto ou serviço — Kives soube usar o marketing de maneira extremamente habilidosa. Tanto que construiu um império, cujos produtos tornaram-se parte da cultura de massa das décadas de 1970 e 1980.

Até hoje seus discos figuram nos melhores sebos mundo afora e suas coletâneas continuam fazendo a alegria de colecionadores e saudosistas.


0 0 votos
Classificação do artigo
Inscrever-se
Notificar de
guest
0 Comentários
mais antigos
mais recentes Mais votado
Feedbacks embutidos
Ver todos os comentários

QUEM SOU EU

Daniel Couri, formado em Jornalismo pelo Centro Universitário de Brasília, fã de cultura pop e autor dos livros Made in Suécia – O Paraíso Pop do ABBA (Página Nova, 2008) e Mamma Mia! (Panda Books, 2011). 

danielcouri@obscuradoria.com.br

0
Adoraria saber sua opinião, comente.x